Défice do Estado português - 1º capítulo
Desde a saída de Sousa Franco do Ministério das Finanças que temos assistido a um certo descontrolo das finanças públicas. Governos sucessivos (as duplas Guterres/Pina Moura, Barroso/Ferreira Leite e Santana Lopes/Bagão Félix) não têm conseguido controlar eficazmente a despesa pública corrente (foi mais fácil refrear inevstimentos do Estado, uma medida francamente negativa num país a sofrer um periclitante crescimento económico) nem aumentar consistentemente o nível de receitas do Estado (vamos ser sinceros, 19% de IVA, um imposto sobre o consumo, já é demais para uma economia a necessitar de reanimação, e os contribuintes dependentes já estão no limite da corda do que que podem pagar de impostos directos).
Todos os anos fomo-nos habituando a considerar como normais tentativas extraordinárias de escamotear o défice estrutural que se vinha a instalar nas contas públicas portuguesas - desde contabilizar como receitas do Estado alienações de participações da Partex, até à venda extraordinária de activos públicos e a transferência de fundos de pensões de empresas de participação pública para os regimes de pensões do Estado (o caso do fundo de pensões da CGD, um movimento claro contra uma economia liberal e de Estado de direito democrático). Tivémos inclusivamente o triste privilégio de assistir no final do ano passado a duas autênticas anedotas de má gestão de contas nacionais - o aumento desmesurado das previsões de crescimento do PIB para efeitos de Orçamento de Estado (que pressupunha questões tão realistas como a queda do preço do petróleo... - e estamos a falar do principal documento de gestão do Estado, o que é tão escandaloso que deveria comportar procedimentos judiciais contra quem elaborou e ratificou um documento tão mal feito - numa empresa privada, seria razão para despedimento imediato) e a constatação da derrapagem do défice a apenas 15 dias do final do ano (o que deu origem a afirmações públicas de altos responsáveis governativos tão incríveis como "Não há problema, estamos a abrir um processo negocial para vendermos participações da Petrogal na próxima semana para podermos fechar negócio antes do final do ano e contabilizar essas receitas para corrigir o défice" - qualquer pessoa que esteja em Vendas sabe que é um suícidio negocial darmos o queijo e faca à contra-parte numa venda, o nosso poder negocial fica tão diminuído que o preço de venda será irrisoriamente baixo). - é o resultado directo da política tipo 'Caras' (medidas de curto prazo, afirmações bombásticas que nunca passavam de intenções, preocupação excessiva com a imagem em lugar da tomada de decisões concretas, falta de capacidade analítica e financeira, incapacidade de gerir pessoas, incapacidade de ver mais além do que o muito curto prazo)
Mas as receitas extraordinárias têm um problema. São extraordinárias. Ou seja, não resolvem as verdadeiras questões e esgotam-se depressa. Por isso, Portugal deverá apresentar um défice orçamental de 4,9% em 2004, bem acima dos 3% do Pacto de Estabilidade. E, pela segunda vez em 5 anos, a vai ser instaurado a Portugal um processo por défice excessivo.
A acompanhar atentamente nos próximos tempos. Com a consciência que o país não se pode dar ao luxo de enfrentar os problemas de frente - como já não faz desde os tempos de Sousa Franco.